quarta-feira, dezembro 15, 2004

valter hugo mãe

Lembro-me bem, ainda a Quasi estava na sua fase inicial, da forma entusiasmada como o valter me falava da editora, dos primeiros livros, dos primeiros autores, do orgulho em editar alguns dos poetas que ele mais amava, o Ramos Rosa, a Fiama Hasse Pais Brandão, o Manoel de Barros, o Jorge Melícias, o Daniel Maia-Pinto Rodrigues, o Jorge de Sousa Braga, entre muitos outros, da alegria de estrear autores, como o Rui Cóias e a Ana Paula Inácio. Durante anos fui acompanhando o trabalho da editora nas conversas de fim-de-semana no «Pátio», em Vila do Conde, testemunhando o trabalho conjunto com Jorge Reis-Sá de construir esta casa de livros. Quando há dois anos o valter me convidou para trabalhar com ele estava longe de imaginar que iria ter uma experiência profissional tão estimulante. Pelos livros, como é óbvio, a Poesia do Daniel Faria, antes de mais, o Kafka, o Beckett, o Luxúria Canibal, os Mão Morta, o Lautrèamont. Pelo ambiente extraordinário. E pela cumplicidade na criação literária; o valter tem o dom incrível da literatura oral, parece uma versão contemporânea dos aedos da Grécia Antiga, esses poetas itinerantes que narravam de memória e em verso as aventuras e mitologias gregas. Nunca me esquecerei do dia em que apareceu a dizer que estava a escrever o nosso reino, e me começar a narrar o romance, como se estivesse com as páginas estampadas na cabeça, e a contar-me do miúdo que queria ser santo, porque os santos são as pessoas mais próximas de deus, do homem mais triste do mundo, acompanhado do cão, a transportar as almas dos defuntos, da crueldade do carlos e as suas histórias surrealistas sobre áfrica. Durante duas semanas, ouvi-o por episódios a falar-me de estas e muitas outras personagens, todos os dias à espera de saber mais. Estou plenamente convencido de que este livro é uma obra-prima, e tenho uma inegável vaidade por ele mo ter dedicado. Depois foram surgindo outros romances, mas sobre isso não poderei falar.
Hoje é o primeiro dia em que valter não está na Quasi, eu sei que nada vai ser como dantes, que muito do encanto da editora se vai perder, mas a vida é assim mesmo, outros projectos lhe estão destinados. Continuarei a encontrá-lo aos fins-de-semana em Vila do Conde, no «Pátio», ou em outro lugar. Sei também que o poderei visitar na casa de osso, acolhimento das coisas perfeitas, poetas sublimes, músicos geniais, pintores arrebatados, histórias secretas, mundos encantados, ilustrações quotidianas.


Comments:
um texto muito, muito delightful!

...só acho que estás a colocar a fasquia da casa do osso tão alevantada, lá bem juntinho ao céu, que os meros mortais como eu vão entrar lá mudos e sair calados, sem provar um só cachito do etéreo nectar dO nossO Mãe.
 
a ver vamos... para já, registei-o no meu blog
 
Em relação ao Valter tens TODA a razão do que dizes... Por acaso, sempre pensei no VALTER HUGO MÃE como "contador de estórias". Acho que ele tem muito jeito. Tem muita eloquência. É muito cativante.Espero um dia vê-lo nessas funções. Tudo de BOM para ele..e pros NOVOS projectos. Tem o meu apoio (como sempre)! Sorte tiveste TU em trabalhares com ele. Deve de ter sido mt gratificante. E o Clave?!?!! tb é ponto de encontro :PP
Viva o sr. Benjamin...lol!
 
Pois, o clave. Não referi porque raramente falámos da Quasi lá. à próxima não me esquecerei
 
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