segunda-feira, julho 18, 2005

A propósito da esquerda

O século XIX ocidental foi o século mais desequilibrado de sempre em termos de distribuição de riqueza. A(s) Revolução(ções) Industrial(ais) levou(aram) a um crescimento a pique da produção e consequentemente da riqueza mas apenas uma pequeníssima minoria beneficiou desse crescimento.
O século XX corrigiu esse desequilíbrio, e durante décadas foram promovidas políticas sociais que deram origem a sociedades com um nível de vida incomparavelmente superior às do passado.
Para que isto se tornasse possível foi muito importante o aparecimento dos sindicatos, dos movimentos políticos operários e sobretudo de algumas ideologias políticas como o socialismo o comunismo e o anarquismo. O comunismo revelou-se um autêntico desastre para os países que o experimentaram, mas a verdade é dificilmente os governos ocidentais se teriam mostrado tão sensíveis às reivindicações dos trabalhadores se não fosse o fantasma e a pressão do Bloco Leste sobre o lado ocidental da Europa.
Hoje, que essa pressão já não existe e as classes trabalhadores perderam grande parte do seu poder de persuasão, começa-se a assistir a um recuo dos direitos que os trabalhadores foram adquirindo ao longo dos anos. O reaparecimento em força do neoliberalismo tem aliás muito que ver com isto. A situação agrava-se ainda mais porque se verifica que as sociedades mais liberais são exactamente aquelas que apresentam melhores perfomances económicas.
Perante este cenário vejo com muito pessimismo o papel da esquerda nos próximos tempos. Poder-se-ia dizer que o século XIX foi de direita, o XX, de esquerda, e o XXI será novamente de direita. Como isto é extremamente perigoso, cabe aos ideólogos de esquerda provar que é possível criar uma alternativa ao liberalismo, que é possível promover boas perfomances económicas sem pôr em causa os direitos dos trabalhadores e sem alimentar maiores desequilíbrios sociais. É muito importante contudo que entendam que se não pode confundir direitos com privilégios, para que não se percam em questões secundários em detrimento das essenciais.
Esta luta pelos direitos adquiridos dos funcionários públicos, por exemplo, parece-me ter muito mais que ver com privilégios do que com direitos sociais. Pelo contrário todo o esforço que foi feito para garantir um sistema de saúde gratuito, um sistema de segurança social abrangente e uma instrução básica para todos os cidadãos não pode nunca ser abandonado. Deve aliás haver um empenho ainda maior, pois ainda existem muitas deficiências a este nível. Do mesmo modo, parece-me essencial lutar contra esta tendência para a privatização de certos serviços que o Estado tradicionalmente assume, como a água, o saneamento, a electricidade, os transportes ferroviários, os correios.


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